11.11.08

Fim



Enquanto ela dorme tranqüila, ele silenciosamente pega umas camisetas, umas cuecas e o desodorante, que ele nunca esquece, e enfia na mochila. Parecia pequena a parte dele naquele apartamento, tão pequena que cabia numa mochila. Depois de 3 anos morando com alguém que sabe fazer tudo melhor que qualquer um, ele não se lembrava mais como era fazer uma mala.

Fechou a porta do quarto sem fazer barulho e sem nem mesmo olhar para o corpo dela esparramado na cama. Não porque estava bravo nem por medo de desistir. Não olhava porque simplesmente já não se importava.

Eram três horas, e ele estava sem sono. Abriu a porta do apartamento, colocou a chave na mesinha da entrada e fechou sem trancar, para não ter que levar a chave. Arrumou a mochila nas costas, desceu o elevador em silêncio, com a cabeça cheia de um monte de pensamentos ao mesmo tempo, mas nada muito claro.

Passou pelo porteiro, que dormia profundamente debruçado na mesa, e saiu. Desceu a pé a rua escura. Mais ninguém andava por ali. Depois de algumas quadras, virou a esquina em direção ao mundo, sumindo dessa história.

Naquele domingo, ela acordou tarde, passou a mão pelo colchão e não achou ninguém.

Viu a hora e foi para a sala ver o que ele estava assistindo na TV, mas o apartamento estava vazio. Uma sensação estranha apareceu na garganta e um frio tomou conta do peito, mas um sorriso meio bobo não queria deixar que ela visse o que estava acontecendo. Ela pegou o celular e ligou. Tocou, tocou e ninguém atendeu. Ela insistiu mais algumas vezes e desistiu. O olhar vago, perdido, procurava uma direção.

Ela sabia que isso ia acontecer. Não sabia quando, mas sabia exatamente por quê. Ele era calmo, eles nunca tinham brigado e ela abusava disso. Fazia o que queria, sem pedir licença ou desculpa, mesmo prevendo que esse seria o resultado, ora porque se esquecia, ora para aproveitar ao máximo tudo de bom que estava acontecendo.

E agora ela estava ali, sentada no sofá, olhando para o apartamento que já tinha sido só dela e depois, por 3 anos, foi o lugar dele, com as coisas dele, que ela fazia para ele, que ele ajudou a escolher, onde ele andava de cueca mesmo quando a janela estava aberta.

Ali ela ficou sentada, olhando o mundo para onde ele tinha ido sem conseguir enxergar nada claramente, quieta, até sumir no amargo da dor.